Sob frio de 8 graus, prefeitura expulsa moradores de área pública

No instante em que os termômetros marcavam 8 graus na manhã desta segunda-feira, 13, em Campo Grande, dezenas de barracos foram destruídos pela prefeitura numa operação de desocupação de área pública invadida desde o sábado passado por cerca de 70 famílias na Rua Brígida de Melo, no Jardim Los Angeles.

As moradias precárias construídas com lona plástica, madeira e restos de compensado vieram abaixo com o uso de uma retroescavadeira, cujo operador foi escoltado por homens da Guarda Civil Metropolitana e da Polícia Militar.

O clima era de revolta, principalmente por conta do frio e da concentração de muitas crianças e mulheres grávidas, que por não terem para onde ir ameaçavam reconstruir os barracos.

Gás lacrimogêneo

Segundo o pedreiro Josinei de Araújo da Silva, 26 anos, os agentes chegaram no local por volta das 9h de hoje, já com armas em punho e fazendo uso de gás lacrimogênio e spray de pimenta. No barraco, moravam ele e a esposa Wuelica Vitória, de 18 anos, grávida de 3 meses.

“Isso aqui é área pública, estava tomada por lixo. Viemos ocupar, porque não temos casa e nem como pagar aluguel. Estava cheio de lixo aqui. Eles tiram a gente, mas não tiram o lixo. Chegaram já apontando as armas e usando gás para dispersar a gente, mas não vamos desistir”, disse o pedreiro.

Destruição total

Assim como ele, a família do pintor Fernando Genário, 38 anos, também teve o barraco derrubado. No local, moravam ele, a esposa Ariane Michelle Vieira, 37 anos, e o filho Marcos Daniel Vieira, 19 anos.

“Só deu tempo de pegar os documentos e sair do local, logo a retroescavadeira derrubou tudo. Até o celular do meu filho ficou no meio dos destroços, não temos nem para onde ir”, declarou Ariane.

Mais despejos

No dia 20 de março passado, um domingo, outra área pública foi alvo de reintegração de posse, no Parque do Sol. O despejo, também precedida pela destruição dos barracos, foi realizada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano (Semadur) em conjunto com a Guarda Civil Municipal de Campo Grande e a Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários (Amhasf).

A moradora Alessandra Benites Duarte, de 40 anos, vivia com mais 4 pessoas em um dos barracos da ocupação, sendo eles seu marido, dois adolescentes e uma criança. “Eu estava acordada e começaram a destruir o [barraco] da minha sobrinha, ela dormindo com criança e tudo. Destruíram tudo e estão destruindo com um monte de criança e família que tem filho pequeno”, disse.

Alessandra disse possuir inscrição na Asmhaf (antiga Ehma) e há 25 anos aguarda um terreno que até o momento ainda não recebeu. Ao falar de como ficará a situação da família daqui pra frente, a moradora afirma que ficará na casa de alguém enquanto ergue seu barraco de novo.

Mais favelas e menos casas

Em suas andanças pelo interior do Estado, o ex-prefeito Marquinhos Trad, candidato a governador, tem divulgado números fictícios sobre os investimentos em habitação em Campo Grande, escondendo ainda o maior legado de sua gestão, que foi a incapacidade de conter a retomada do processo de favelização no município.

Atualmente, mais de 42 mil famílias estão na lista de espera por uma habitação popular em Campo Grande, que conta hoje com 38 favelas, com 4.516 moradias, conforme levantamento da Central Única de Favelas (Cufa). Outros sete núcleos semelhantes estão em formação, de acordo com Letícia Polidoro, presidente da entidade.

Mesmo diante da constatação de que o número de favelas praticamente dobrou em Campo Grande nos últimos 10 anos, o prefeito Marquinhos Trad insiste em dizer o contrário. À imprensa, ele diz que existem apenas “áreas ocupadas de forma irregular” na Capital, no que foi rebatido pela presidente da Cufa: “ele precisa andar e conhecer melhor a cidade onde é gestor”, disse Letícia, em março deste ano.

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Joel de souza

Radialista a mais de "48" anos na cidade de Corumbá, Joel trabalhou na Rádio Clube, Difusora e FM Pantanal, fez grandes coberturas como o Carnaval de Corumbá.